A polêmica sobre o Estado laico continua
A polêmica sobre o Estado laico continua
Com a fim da dosimetria das penas, está chegando ao fim um dos mais importantes julgamentos já enfrentamentos pelo Supremo Tribunal Federal. Com as modernas tecnologias de informação, a sociedade teve a oportunidade de acompanhar de perto todas as fases do processo, o que trouxe ao STF uma visibilidade jamais alcançada.
Durante todo esse tempo de julgamento, mais precisamente 49 sessões em 4 meses, um pequeno objeto ao fundo chamou a atenção a observadores mais atentos, e que vem a ser um flagrante desrespeito à laicidade do Estado, um dos pilares da cidadania: o crucifixo cristão.
De fato, como previsto na Constituição Cidadã de 1988, cabe ao Estado garantir a liberdade de crença e culto religioso. O que não significa trazer para dentro de si uma ou mais religiões, como expressa o Artigo 19: “É vedado à União, aos Estados, ao Distrito Federal e aos Municípios estabelecer cultos religiosos ou igrejas, subvencioná-los, embaraçar-lhes o funcionamento ou manter com eles ou seus representantes relações de dependência ou aliança”.
Nesse sentido, o próprio Ministério Público ganhou o noticiário semana passada, ao ajuizar ação civil pública para a retirada da expressão “Deus seja louvado” de nossas cédulas. Pois fica aqui a pergunta: “Por que o Ministério Público também não pede a retirada de um símbolo eminentemente ligado a uma religião específica, em detrimento de outras? ”
Não se trata de crítica ou ataque a qualquer religião ou suas instituições. Trata-se de compreender o correto conceito de separação entre Estado e religião que não é, como poderia parecer a alguns, abrigar todas no Estado como forma de tolerância religiosa ou de explicitar nosso pluralismo no tema. O espaço público, como bem expressou a professora Flavia Piovesan em recente artigo nos jornais, “o estado democrático de direito não pode ser refém de dogmas religiosos do sagrado, mas deve garantir a diversidade de doutrinas religiosas, filosóficas e morais como condição da própria cultura pública democrática”.
O próprio Supremo está às voltas com o tema. Pelo menos, duas ADI questionam o atual formato de ensino religioso público no país, com forte tendência a excluir doutrinas e tornar obrigatória uma matéria que é facultativa pela Constituição.
Seria uma boa oportunidade para a mais alta corte do país dar o devido exemplo de cidadania e retirar de seu próprio plenário um exemplo claro de desrespeito à constituição. Aliás, em sua atual composição, o Supremo tem pelo menos um ministro de credo judaico. O que ele pensa a respeito do tema?