Artigo – do Diário do Comércio de São Paulo: “A privilegiatura e a farsa da República, por Jorge Maranhão

Ainda com relação à polêmica sobre o texto reproduzido pelo presidente Jair Bolsonaro, que é de autoria de Paulo Portinho, funcionário da Comissão de Valores Mobiliários (CVM) e membro do Partido Novo, a ingovernabilidade do país é devida aos inúmeros sindicatos que tomam conta do orçamento público.

E nem precisa dar nomes aos bois, uma vez que passaram a chover campanhas e vídeos de associações e sindicatos de funcionários públicos nas redes sociais que resolveram vestir a carapuça defendendo seus “direitos adquiridos” contra a reforma da Nova Previdência.

Não tenho nada contra as corporações defenderem suas chamadas prerrogativas diante dos empregados do setor privado, mas não podemos argumentar com falácias barroquistas.

Temos de ter em mente de maneira mais clara possível as diferenças entre prerrogativas e privilégios. E o princípio moral que inibe tais diferenças.

Quando todos puderem, se quiserem, ter um mínimo de saúde, educação e cidadania, tudo bem, que se diferenciem os mais indispensáveis para o bem público dos mais comuns dos mortais. Os detentores de prerrogativas diante dos detentores apenas de direitos.

Mas “direitos adquiridos” me parece abuso de direitos. Pois podem ter sido “adquiridos” por meios ilegítimos, uma vez que nem todas as leis se pautam pelos princípios da moralidade pública.

Seguindo a regra de ouro da tradição moral ocidental, de que tudo que não puder ser minimamente constituído como direito de todos, na verdade, não pode ser concedido como direito de ninguém, temos o próprio fundamento da democracia e da república.

O que implica que todos somos iguais perante a lei, ou que não se pode defender apenas para sua categoria o que não possa ser estendido a todas as demais. A menos que se aceite o inaceitável que é a farsa de uma república torcida nos paradoxos do barroquismo mental.

Uma república que não é de todos, mas cativa de corporações organizadas em verdadeiros sindicatos de defesa de privilégios, simplesmente não é uma república. Mas apenas uma farsa.

Não se trata, portanto, da luta decisiva de um presidente contra a chamada privilegiatura, mas uma luta de todos os cidadãos comuns que querem mudar o Brasil para que este se aproxime mais de uma verdadeira república.

Neste sentido, identificar e dar nomes aos bois dos republicanos de araque, dos farsantes da pátria, dos renitentes contorcionistas da realidade, dos sofistas de plantão, dos retóricos das falácias, barroquistas privilecos, passa a ser dever cívico e moral de todos os cidadãos comuns.

Que devem identificá-los para o escrutínio de todos os demais cidadãos. E segue a lista para o conhecimento público, não apenas dos sindicatos das corporações que privatizam os recursos públicos, mas a lista de seus “direitos adquiridos”.

Que o leitor examine e faça, inclusive, contribuições de acréscimo ou de exclusão se os argumentos lhe parecer convincentes, sempre à luz do princípio moral de que se exija mais dos que têm mais para servir do mínimo os que menos têm:

  1. Liste-se o quanto somam os penduricalhos salariais e benefícios das elites dos agentes públicos como magistrados, promotores, procuradores, auditores fiscais e demais que lhes assemelham. Os “servidores-sindicalistas”, para além dos “sindicalistas de toga”.
  2. Mas que se aproveite e se explicite quem são os “sindicalistas de cátedra e de reitorias”, que acabaram estendendo seus privilégios para os demais cargos da cúpula administrativa e “autônoma” das universidades públicas.
  3. E também os “sindicalistas do regime próprio” da Velha Previdência. Das altas pensões do RPPS que sempre poderão ter a previdência complementar privada como alternativa;
  4. Assim como os empresários estado-dependentes, “sindicalistas de oligopólios” com dinheiro público, “os campeões nacionais”. Os que nadam de braçada nos créditos subsidiados dos bancos públicos para grandes empresas;
  5. Ou os “sindicalistas de tribuna”,da privilegiatura das legislaturas parlamentares, com verbas de  gabinete, auxílios-paletó, moradia, correios e outras espécimes raras;
  6. Ou os “sindicalistas das estatais” que se fartam de aportes do tesouro para mais de 400 empresas que só dão prejuízo para a União, sustentados com os impostos de todos os cidadãos e apadrinhados por políticos que são seus verdadeiros controladores;
  7. Ou os “sindicalistas dos subsídios” ou das desonerações de setores empresariais inteiros cevados de ganhos públicos fáceis, sem se expor a qualquer competitividade;
  8. Ou os “sindicalistas da pelegagem” que vivem dos impostos e contribuições sobre os salários dos trabalhadores, tanto para alimentar sindicatos de pelegos como a jabuticaba da justiça do trabalho que só existe no Brasil;
  9. Ou os“sindicalistas da burocracia federal”, que de federal não tem nada, pois que cuidam para que os orçamentos dos entes da União vivam a passear por Brasília para depois retornar aos estados e municípios em forma de toma lá dá cá.
  10. Por fim, quanto aos “sindicalistas da contra-informação”, que se dê melhor uso aos orçamentos escandalosos de publicidade estatal direcionados às grandes mídias que, a cada dia, perdem mais audiência em face da concorrência dos canais independentes das redes sociais.

Já apresentei em meu último livro (*), inclusive, uma alternativa de legitimação dos orçamentos estatais com a mídia. Não através de campanhas ditas de “marketing” dos entes federados ou da União, mas de um programa de publicização de valores, segmento por segmento, dos orçamentos destinados a sindicatos e corporações e seus privilégios, para que a opinião pública tenha condições de formar seu melhor juízo.

Enfim, que se demonstre publicamente os cortes dos privilégios dos que apostam no fracasso do país, dos que se opuseram e se opõem diariamente, não apenas ao governo legitimamente eleito, mas a um Brasil mais justo, próspero e republicano.

(*)“Destorcer o Brasil. De sua cultura de torções, contorções e distorções barroquistas”

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